Pular para o conteúdo principal

OURO DE TOLO E OUTRAS QUINQUILHARIAS

Toda história tem, no mínimo, dois lados. Duas versões, no mínimo, toda história tem.

 

Se uma pessoa nos apresenta apenas uma versão de um acontecimento, isso não significa necessariamente que ela esteja querendo nos engambelar.

 

Na maioria dos casos, é a versão que a pessoa acredita ser verossímil e, de boa ou má fé, está lhe vendendo como sendo “a história”.

 

Agora, se somos daquele tipo de cidadão que se considera a “fina flor da criticidade”, nós teríamos o dever grave de procurar conhecer o maior número possível de versões, interpretações e relatos sobre os fatos que são apresentados; inclusive os detalhes não contados a respeito de todo e qualquer causo.

 

Parêntese: essa seria uma obrigação todinha nossa e não daqueles que estão nos comunicando uma das versões sobre os fatos. Fecha parênteses.

 

Infelizmente, muitos de nós acreditam mesmo que as pessoas que representam os interesses de grupos de pressão, que militam em prol de uma ideologia ou partido político, teriam a obrigação de nos contar todas as minúcias sobre os acontecimentos.

 

Sim, em princípio deveriam, por um dever de consciência, mas, como todos nós muito bem sabemos, se um indivíduo representa os interesses de um grupo e procura orientar suas ações com base nos ditames de uma ideologia, isso significa que esse dever acabou sendo secundarizado, ou transubstanciado, em sua vida, bem como os juízos de sua consciência.

 

Doutra parte, meu caro Watson, nós também temos o dever de consciência de procurar conhecer a verdade sobre os acontecimentos, mesmo que nos cause dor e amargor. Ah! Como temos.

 

Agora, se somos daqueles que, por preguiça cognitiva e moral, preferimos simplesmente aderir a uma versão que mais nos agrada, ou àquela que parece ser a que rende uma imagem de pessoa sabida e crítica, tal impostura será de sua inteira responsabilidade e refletirá o torpor em que se encontra o seu caráter.

 

Trocando em miúdos, a ignorância amorosamente cultivada por nós é todinha nossa e de mais ninguém.

 

Gostemos ou não, nós a desejamos com todas as forças de nossa alma, achando que estávamos sendo espertos e, como dizem, fazendo um baita negócio. Pois é. E que negócio. Fazer pose de gente crítica para não tomarmos consciência do quão otários somos.

 

Diante disso, o que nos resta é uma xícara de café.


*


Escrevinhado por Dartagnan da Silva Zanela - professor, escrevinhador e bebedor de café. Autor de “A QUADRATURA DO CÍRCULO VICIOSO”, entre outros livros.




Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

FRAGMENTOS DE UM DIÁRIO HETERODOXO #025

Toda guerra é uma sucessão de erros de cálculo e estratégias equivocadas e, por isso, na maioria das vezes, o vencedor acaba sendo aquele que cometeu menos erros, e não necessariamente quem lutou com mais maestria. # O ser humano, como nos lembra Cornelius Castoriadis, é um bichinho louco, cuja insanidade envenenou a sua claudicante razão. # Temos que nos esforçar para compreender como a história transforma a sociedade, como ela nos transforma e, é claro, de que maneira o seu estudo e aprofundamento a transforma. # As mais terríveis tiranias muitas vezes começam logo após a conquista de uma emancipação nominal. # É de fundamental importância compreendermos que o tal do progresso não é apenas um fenômeno complexo, ele é acima de tudo incerto. # Não há neste mundo uma coisa que seja mais enigmática do que a simplicidade. # Escrever sobre a história de qualquer coisa, em grande medida, é sempre interpretá-la. Interpretá-la de forma justa e correta, ou de maneira leviana e equivocada. * Es...

UM DIA DE NOVEMBRO

Uma vida bem vivida Para de fato sê-lo Precisa que os dias Sejam realmente vividos A contrapelo. Conheci há muito tempo Ainda quando moço Num dia de alvoroço Uma moça linda, nascida Em novembro. O tempo no seu passo Passou e cá estou Tímido feito canário Cantando desafinado Feliz aniversário Para a mulher que Eu amo. 06/11/2025

ESTAVA CHOVENDO MUITO NAQUELA NOITE

Nos famigerados anos 80 fiz um curso de datilografia. Sim, eu fiz. Meus pais haviam comprado uma Olivetti portátil, cor verde. Uma beleza. Então todas as terças e quintas à noite, lá ia o pequeno Darta com aquela maleta verde para o colégio para aprender a usar apropriadamente o barulhento e pesado instrumento de escrita. Eu queria usá-la com a mesma maestria que meu pai, que datilografava um texto sem olhar para a máquina e, ainda por cima, o fazia com a devida tabulação. Era uma destreza que eu admirava.   Quando colocava-me em marcha rumo ao colégio, sempre era acompanhado pelo meu grande amigo Monique, meu cachorro. Não sei porque ele tinha esse nome. Quando iniciamos nossa amizade ele já respondia por essa alcunha. Pequenino, de pelo marrom-caramelo, bem clarinho, de cambitos curtos e, tal qual eu, um legítimo vira-lata.   Enquanto caminhava para o meu destino, ele ia junto comigo, ao meu lado e, no caminho, íamos batendo altos papos. Sim, quando criança, conversava muito...