Pular para o conteúdo principal

O SUTIL VENENO DO RELATIVISMO

As palavras não nos enganam. Nem elas, nem a realidade a qual elas se referem. Somos nós que nos enganamos, que nos permitimos ser enganados.

 

Dito de outro modo, as palavras, de um modo geral, são claras e cristalinas; dúbio e malicioso é o uso que muitas vezes é feito delas.

 

As palavras são límpidas; pernicioso e cheio de desídia é a nossa pressa leviana para chegarmos a um termo que seja apetecível ao nosso desamor pelo conhecimento.

 

Poderíamos seguir com o andor por muitas léguas, porém, creio que isso não seja necessário.

 

Imagino que para bom entendedor, como dizem os populares, meia dúzia de palavras são mais do que suficientes para iniciar uma franca reflexão.

 

Já para aqueles que, por indolência, preferem entregar-se garbosamente ao relativismo, fazendo pose de desentendido, com ares de superioridade, ignorando a realidade, ou apenas apegando-se àquilo que lhe permita sentir-se confortável, nem todas as palavras do mundo seriam suficientes.

 

Nem mil palavras de sabedoria conseguiriam arrancá-los de sua pirraça porque, para esse tipo peculiar de indivíduos, que abunda nestes idos, as palavras são sempre enganosas, a realidade é sempre duvidosa e, por isso, eles acreditam, de forma obstinada, que apenas os seus juízos sobre tudo são absolutamente irretocáveis.

 

Por essa razão, e por inúmeras outras, que o relativismo moral e cognitivo, quando são usados de forma irrestrita por almas diminutas, acaba se tornado um instrumento terrível de degradação da inteligência.

 

E, assim o é, porque se o sujeito convence-se que sua subjetividade tem mais valor que a própria realidade, sem perceber, o abençoado acaba por solapar as bases que o permitiriam abarcar e compreender o mundo real.

 

Mundo real esse que sempre será maior e mais complexo que nossa capacidade de abarcá-lo e compreendê-lo, mesmo que insistamos em dizer para nós que isso seja relativo.

 

Por exemplo: se nós temos alguma desavença com alguém, cremos que nós temos toda a razão a respeito da discórdia e, da mesma forma, nossos antagonistas também creem estar cobertos de razão; porém, entre um e outro há um trem que, no caso, é a realidade do acontecido, que nos remete a razões que são superiores às razões de ambas as partes, e que as abarcam, superando-as.

 

A verdade ilumina nossa inteligência quando abrimos as portas da nossa percepção para o real, nos ajudando a compreender que é nossa posição frente ao mundo – e diante de Deus - que é relativa e, por isso, limitada.

 

E por sermos limitados e relativos diante de tudo e todos, acabamos por não captar facilmente a clareza das palavras.


Nem delas, nem da realidade a qual elas se referem porque, malandramente, preferimos continuar acreditando que enganar-se dessa forma seria algum tipo raro de esperteza que, os tontos diplomados, preferem chamar por outros nomes bem mais pomposos pra disfarçar o vexame.

 

Escrevinhado por Dartagnan da Silva Zanela - professor, escrevinhador e bebedor de café. Autor de “A Bacia de Pilatos”, entre outros ebooks.

https://lnk.bio/zanela



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O ABACAXI ESTÁ EM NOSSAS MÃOS

Dia desses, eu estava folheando um velho caderno de anotações, relendo alguns apontamentos feitos há muito tempo, e entre uns rabiscos aqui e uns borrões acolá, eis que me deparo com algumas observações sobre o ensaio "La misión pedagógica de José Ortega y Gasset", de Robert Corrigan. Corrigan faz algumas considerações não a respeito da obra do grande filósofo espanhol, mas sim sobre o professor Ortega y Gasset e sua forma de encarar a vocação professoral. O autor de "La rebelión de las masas" via sua atuação junto à imprensa como uma continuação de suas atividades educacionais, onde apresentava suas ideias, marcava posição frente a temas contemporâneos e, é claro, embrenhava-se em inúmeros entreveros. Ele afirmava que, para realizarmos com maestria a vocação professoral, é necessário que tenhamos nosso coração inclinado para um certo sacrifício heroico, para que se possa realizar algo maior do que nós mesmos: o ato de levar a luz do saber para os corações que se ve...

FRAGMENTOS DE UM DIÁRIO HETERODOXO #007

Nada se transforma mais rápido em indiferença do que o horror, quando este se torna cotidiano.   #   A ironia, um dia desses, há de nos redimir, ou terminará de nos achatar.   #   Não tenhamos medo de sermos espezinhados; e, se formos pisados, alegremo-nos, porque as ervas, quando são pisoteadas, se tornam caminho.   #   Quanto mais um sujeito se imagina livre, livre da Silva, mais suscetível a ser doutrinado e subjugado ele está.   #   A conversa mofada sobre cultura não é tanto um sintoma daquilo que poderíamos chamar de “a religião dos ateus”, mas sim um claro indicativo da idolatria dos incultos.   #   Toda paixão igualitária é um veneno, uma peçonha que perverte o sentido crítico de qualquer um até o tutano, por atrofiar na alma do indivíduo a faculdade que nos permite fazer distinções.   #   Um dos primeiros passos rumo ao santuário da sabedoria reside na capacidade de admitirmos que nossas ideias – nossas amadas e idolat...

QUANDO O CALDO ENTORNA

Prudência e canja de galinha, como nos ensina o velho ditado, nunca fizeram mal a ninguém. Agora, a falta da primeira tem feito um estrago danado na vida de muita gente. Os antigos nos ensinam que a prudência é a mãe de todas as virtudes, porque ela nos convida a arrancar nossas ações do guiamento das sombras da ignorância para que possam ser alumiadas e orientadas pelas labaredas da sabedoria. E sabedoria não é, de maneira nenhuma, aquela coleção de colóquios aguados que encantam e iludem muitos, sem incomodar ninguém. Sabedoria, antes de qualquer coisa, é o cultivo amoroso pela procura da verdade, onde quer que ela esteja, para que possamos conhecê-la e, conhecendo-a, permitir que ela redima nossos equívocos passados através das nossas decisões no momento presente, projetando, desse modo, uma nova orientação para as nossas escolhas futuras. Por essa razão, ela jamais será um conjunto de frases insossas, reverberadas por pessoas ocas, cheias de presunção e ornadas com títulos toscos e...