Pular para o conteúdo principal

A FÉTIDA FOSSA TÁRTARA

Todos nós acreditamos saber exatamente o que os “outros” pensam a respeito dos temas que, espaçosamente, ocupam o centro das discussões da arena pública, mesmo que não tenhamos, em momento algum, parado para ouvir com a devida atenção o que os tais dos “outros” disseram a respeito.

 

E não estou, de modo algum, sugerindo que seria interessante pararmos para ouvir aqueles que discordam de nós para que, tão somente, possamos, com um bofetão retórico em “si bemol”, argumentar contra aquilo que será dito por essas figuras, figurinhas e figuraças. Francamente, fazer isso é uma tremenda perda de tempo, apesar de ser divertido pacas.

 

É uma perda de tempo porque, praticamente, todos aqueles que se fiam nesse caminho, invariavelmente estão muito pouco preocupados em ouvir o outro e, de quebra, estão muitíssimo afoitos para vencer por vencer um bate-boca, pouco importando se tenham apenas ouvido um cadinho, e compreendido menos que isso, do que lhes foi dito, ficando perdidos, feito um peru encachaçado, ao final do entrevero.

 

Por isso, o que considero como algo que deve ser feito com uma certa urgência, mas sem perdermos a paciência, é realmente ouvirmos com atenção o que as pessoas têm a dizer, principalmente aquelas que veem a realidade por um prisma distinto do nosso.

 

Ouvi-las não para concordarmos com elas, nem para refutá-las na lata, mas sim, para compreendermos o que elas, de fato, pensam a respeito dos temas que se encontram no centro da arena das discórdias públicas.

 

De mais a mais, sejamos francos: todos nós, em alguma medida, fazemos ouvidos moucos uns para os outros porque, no fundo, e não é tão fundo assim, praticamente ninguém quer realmente compreender e encarar a realidade tal qual ela é, mas apenas e tão somente, parecer ter razão. O que, aliás, é ridículo pra caramba.

 

Obviamente, não estou me referindo às lideranças políticas que procuram sempre puxar a sardinha dos fatos para o seu braseiro ideológico. Refiro-me a pessoas anônimas, que têm suas lides diárias, suas predileções ideológicas, mas que não são os atores que estão no centro do picadeiro político partidário. Pessoas como eu e você, meu caro Watson.

 

Nesse sentido, creio que devemos procurar cultivar - como direi - o hábito de sermos bons ouvintes e, generosamente, nos esforçarmos para entender o que nossos semelhantes pensam a respeito dos temas que somos intimados, pelo momento presente, a matutar, principalmente se estes indivíduos discordam em gênero, número e grau de nós.

 

E isso é necessário porque é na confrontação dos pontos de vista contrários que a verdade se desvela aos nossos olhos. Ver a realidade por um único prisma, não ajuda muito não.

 

Bem, mas se insistirmos em ficarmos fechados nas paredes discursivas edificadas pela galera galerosa da nossa amada bolha, continuaremos a caminhar em círculos, feito um cão que não para de correr atrás do próprio rabo, crentes de que, um dia, chegaremos em algum lugar.

 

Enfim, podemos e devemos não concordar uns com os outros, porque, como todos sabemos, toda e qualquer unanimidade é burra, bem burrinha. O que não podemos mais, de jeito maneira, é nos dar ao desfrute de não nos esforçarmos para entender aqueles que concordam em discordar de nós.

 

Escrevinhado por Dartagnan da Silva Zanela

https://sites.google.com/view/zanela

 

Inscreva-se [aqui] para receber nossas notificações.



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

CAMINHANDO SEM PRESSA NA CONTRAMÃO

Recentemente tive a alegria de encontrar em um Sebo o livro “Rubem Braga – um cigano fazendeiro do ar”, de Marco Antonio de Carvalho. Na ocasião, não tive como comprá-lo. Já havia fechado minha compra e, em consequência, não tinha mais nenhum tostão no bolso, por isso, deixei o baita na estante, torcendo para que ninguém o comprasse.   As semanas se passaram e lá estava eu, mais uma vez, no mesmo Sebo e, graças ao bom Deus, lá estava o bicho velho, esperando o Darta para levá-lo. Na ocasião estava indo para uma consulta médica e, enquanto aguardava, iniciei minha jornada pelas páginas da referida obra.   Rubem Braga, o homem que passava despercebido no meio da multidão, percebia tudo, tudinho, que a multidão não era capaz de constatar e de compreender. Não é à toa que ele era e é o grande mestre da crônica.   Ao indicar esse caminho, não estamos, de modo algum, querendo insultar ninguém não. O fato é que toda multidão, por definição, vê apenas e tão somente o que os mil olhos da massa

BUKOWSKI DIANTE DAS AREIAS DO TEMPO

O filósofo argentino José Ingenieros, em seu livro “Las fuerzas morales”, nos lembra que cada época tem que lutar para reconquistar a história. As pessoas de todos os tempos, dentro de suas circunstâncias, devem esforçar-se nessa empreitada. O conhecimento, por sua natureza, encontra-se espalhado pela sociedade, em repouso sobre incontáveis fragmentos, como se fosse um oceano de areia diante do horizonte da existência e, cada geração, deve procurar reconstruir, com as areias do tempo, o palácio da memória, o templo da história porque, sempre, cedo ou tarde, vem a roda-viva e sopra novas circunstâncias em nossa vida mal vivida, que vão erodindo todo o trabalho que foi realizado por nós e pelas gerações que nos antecederam. A cada nova circunstância que se apresenta, é necessário que procuremos atualizar a nossa visão do passado, para que possamos melhor compreender o momento presente e, principalmente, a nós mesmos. Nesse sentido, podemos afirmar, sem medo de errar, que a história é sem

REFLEXÕES INOPORTUNAS (p. 02)

A pressa é inimiga da perfeição, todo mundo sabe disso; mas a inércia covarde, fantasiada de prudência e sofisticação, não é amiga de ninguém e isso, infelizmente, é ignorado por muita gente de alma sebosa.   #   #   #   A soberba precede a queda. E entre ela e a queda há sempre uma grande tragédia.   #   #   #   Todo parasita se considera tão necessário quanto insubstituível, especialmente os sacripantas burocráticos e perdulários.   #   #   #   Fetiche por novas tecnologias não é sinônimo de uma educação de qualidade. É apenas um vício invadindo descaradamente a praia das virtudes.   #   #   #   O maior de todos os erros, que podemos cometer por pura estupidez, é imaginar que estamos imunes a eles só porque temos um diploma na parede e algum dinheiro na conta bancária.   #   #   #   Qualquer um que diga que tudo é relativo, não deveria, por uma questão de princípio, jamais queixar-se [depre]civicamente contra a presença de nenhum político, nem reclamar das picaretagens dos incontávei