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OS MIL OLHOS DA VIGILÂNCIA TOTALITÁRIA

Um dos mecanismos de controle mais eficiente que existe é o medo diante das línguas maldizentes. Todo mundo pela-se de medo de acabar recebendo uma saraivada de olhares de reprovação. E o medo paralisa, invariavelmente é mau conselheiro e engessa o nosso discernimento.

 

Sim, admitamos: a vergonha é um santo remédio. Nos corrige e nos aprimora, desde que tomemos como referência uma tábua de valores sólidos. Porém, o trem muda de figura, tornando-se um instrumento de fragilização da nossa personalidade, e de desfibramento do nosso caráter, quando a referência do embaraço é o vociferar da grande mídia e das multidões, as futricas dos grupinhos de escarnecedores, enfim, quando o parâmetro de certo e errado passa a ser o que os outros irão pensar e dizer a nosso respeito sem saber exatamente quem nós somos.

 

Quando alimentamos esse tipo de medo em nosso íntimo, estamos literalmente nos permitindo ser guiados e moldados por aquilo que seria a face inconstante e volúvel do moralismo disforme das multidões.

 

Tal fenômeno manifesta-se mais ou menos assim: primeiro falamos algo e, rapidamente, nos arrependemos do que falamos devido ao fato de ter repercutido mal diante dos olhares vigilantes de reprovação que, sem pestanejar, nos desossam nas redes sociais, nas ruas, em todos os lugares.

 

Num segundo momento, num lugar qualquer, lá estamos nós, pensando em algo com nossos alfarrábios e, do nada, começamos a nos policiar, dizendo para nós mesmos: “nossa! Já pensou se alguém ouve esses pensamentos? Seria um Deus nos acuda. Melhor parar de pensar nisso”.

 

E, com o tempo, além de ficarmos desfibrados, terminamos por deixar de ser quem nós somos, para nos tornar um reles boneco de ventríloquo, que apenas repete aquilo que é aceito pelo moralismo desorientado do rebanho midiatizado.

 

E é óbvio que, em corações assim, a verdade não tem lugar, porque ela, a verdade, muitas vezes é intolerável para as almas sensíveis e se expressa, frequentemente, de uma forma nem um pouco agradável, porque a verdade é o que é e segue sendo mesmo que todos tenham medo de reconhecê-la, dizê-la e aceitá-la.

 

Escrevinhado por Dartagnan da Silva Zanela

https://sites.google.com/view/zanela

 

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