Um negócio que movimentou uma grana
violenta no século vinte foram as tais colunas sociais e, é claro, não deixemos
de incluir nesse pacote, as ditas revistas que se dedicavam, e ainda se
dedicam, quase que exclusivamente a esse tipo de, como direi,
"conteúdo".
Ah! Sim! Vamos recapitular: colunas
sociais eram, e são, aqueles espaços da grande, da pequena e da insignificante
mídia, reservados para a exibição da vida - social e íntima - de gente grã-fina
ou, ao menos, de pessoas que gostam de fazer pose de gente chique e,
obviamente, nas tais colunas sociais, mostra-se tudo para todos, como se
"a geral" estivesse realmente interessada em conhecer a sua maneira
banal de viver, mesmo que esteja sendo apresentada de forma empolada.
Pois é, mas tem muita, muita gente que
gosta, como gosta, de ter notícias sobre isso.
Atualmente, no terceiro milênio, muito
mais do que na centúria passada, temos a presença desse tipo de comportamento
extravagante e narcisista sendo exibido aos quatro ventos, graças as
famigeradas redes sociais, onde incontáveis pessoas exibem suas vidas sem sal.
Algumas, inclusive, escancaram as suas intimidades, procurando obter a sua
porção de likes desse banal latifúndio virtual.
Dito de outro modo, temos aí aquilo
que se convencionou chamar de “celebridade” que, em grossos traços, seriam
apenas nulidades humanas, sem nenhuma distinção significativa digna de
admiração, que expõem-se aos quatro ventos para serem vistas, cobiçadas,
admiradas, enfim, para serem invejadas por outras tantas pessoas que, ao seu
modo, vivem vidas tão banais e esvaziadas de sentido quanto as delas, só que
anonimamente, sem glamour, sem flash e com meia dúzia de likes.
Pois é, Andy Warhol havia, não muito
tempo atrás, vaticinado que, num futuro não tão distante, todas as pessoas
teriam a glória dos seus quinze minutos de fama, que todos poderiam, por um
cadinho de tempo, se deleitar com as ambrosias ocas das celebridades tontas.
Não sei dizer se todos terão os seus quinze minutos de fama, mas nunca tivemos
tantas celebridades que, na real, nada apresentam que mereça ser celebrado.
Seja como for, aí está, de certa
forma, o vaticínio realizado.
Mas, como diria o capitão Archibald
Haddock: com mil raios e trovões! De onde surgiu essa excrescência cultural?
Quem seria o pai dessa tranqueira? Essa degeneração nasceu nos Estados Unidos,
na primeira metade do século XX, e foi criada por um tal de Walter Winchell, um
judeu-americano nascido no Harlem. Foi ele que transformou a vidinha tosca da
grã-finagem, e daqueles que fazem pose de bacana, em alimento para as almas
vazias, mas, é claro, com seus corações inundados, cheinhos até a tampa, de
ressentimento. E ele sabia muito bem como explorar isso, a tensão dialética que
há entre o exibido e o ressentido.
E o curioso é que o homem que criou
esse trambolho chamado “celebridade” seja hoje um ilustre desconhecido, pois
esse é o destino de todos nós, tenhamos ou não nossos minutinhos de fama neste
mundo de pó e sombras.
Também não deixa de ser curioso, na
falta de uma palavra melhor, que as pessoas que estiveram mais próximas de
Walter Winchell, que trabalharam por décadas junto com ele, tenham sido
muitíssimo sofridas. As duas mulheres com quem casou também se enquadram na
mesma categoria. E se isso já não fosse o suficiente, a filha de Winchell
enlouqueceu e seu filho tirou a própria vida. É. Isso, na época, as câmeras não
mostravam.
Bem, sigamos em frente: como
atualmente um número significativo de pessoas tem o seu coração voltado para as
efemeridades do momento, com suas emoções midiaticamente sintetizadas pelas
insignificâncias momentâneas, com suas subjetividades alucinantes, não são
poucos os corações que acabam por ser subjugados ao império do banal, e tendo o
seu discernimento mutilado pelo que há de mais rasteiro em nós.
Ou como diria o filósofo coreano
Byung-Chul Han, em seu livro “Psicopolítica”, no mundo atual, nos tornamos
serviçais das emoções midiaticamente construídas que, ao seu modo, nos
estimulam freneticamente a aderirmos ao mundo das aparências superficiais e, ao
mesmo tempo, tais emoções artificiosas nos dão a sensação epidérmica de que
estaríamos agindo de forma autônoma ou, como muitos gostam de dizer,
acreditando que estariam agindo “criticamente”, ao mesmo tempo que estão sendo
maquiavelicamente manipuladas.
Dito de outro modo, no mundo atual,
não consumimos coisas, mas sim, apenas emoções, como se isso fosse sinônimo de
prosperidade. Não votamos em pessoas e partidos, mas sim, simplesmente aderimos
a um círculo de aceitação afetiva, como se isso fosse sinônimo de atuação
cívica. Não ampliamos nosso espectro de compreensão, mas sim, somente
sinalizamos, de forma escandalosa, que determinados assuntos nos agradam e que,
outros tantos, nos indignam, como se isso fosse sinônimo de tomada de
consciência.
Trocando em miúdos, sem nos darmos
conta, o culto das “celebridades” em misto com a tremenda falta de sentido que
impera em nossas vidas, acabam por contribuir, de forma significativa, para a
edificação de um contexto, mais do que perfeito, para a infantilização da
sociedade, levando os indivíduos a brincarem de “cidadão crítico, atuante e
engajado”, ao mesmo tempo que estão sendo sorrateiramente manipulados através
do espelho negro que está no centro de sua sala, diante de seu sofá, ou na
palma de sua mão.
Escrevinhado por Dartagnan da Silva
Zanela
https://sites.google.com/view/zanela
Inscreva-se [aqui] para receber nossas notificações.
Comentários
Postar um comentário