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Mostrando postagens de setembro, 2025

POR UM O PONTO ARQUIMÉDICO

O filósofo polonês Leszek Kolakowski nos ensina que, quando começamos a cogitar a possibilidade de sermos uma grande farsa, é o momento em que realmente estamos iniciando nossa jornada pelas sinuosas veredas da filosofia. Se não somos capazes de olhar de frente as nossas misérias demasiadamente humanas, é sinal de que a nossa alma ainda se encontra mergulhada no fundo de uma caverna lúgubre, feito o Gollum do “Senhor dos Anéis”, que não se cansa de ficar acariciando o seu precioso, ao mesmo tempo que se divorcia da realidade. Podemos dizer que no mundo atual somos uma multidão de Gollums vagando de um lado para o outro, cada qual com o seu precioso, perdendo a lucidez, que é a pior cegueira que há, como nos lembra José Saramago. Falta de lucidez essa que nos torna cegos para o mal que se encontra aninhado em nosso coração e que nos impede de reconhecer a humanidade daqueles que odiamos - e que desumanizamos - sem saber porquê. Hannah Arendt, em “As Origens do Totalitarismo”, nos exp...

NO PARAÍSO OCULTO DAS LETRAS APAGADAS

Paul Johnson, no livro “Inimigos da Sociedade”, afirmava que uma das grandes delícias da vida é poder compartilhar suas ideias e opiniões. Bem, estou a léguas de distância do gabarito do referido historiador, mas posso dizer que, de fato, ele tem toda razão. É muito bom partilhar o pouco que sabemos com pessoas que, muitas vezes, nos são desconhecidas, pessoas que, por sua vez, pouco ou nada sabem a nosso respeito. E essa imensidão de desconhecimento que existe entre autores e leitores deve ser preenchida para que aquilo que está sendo compartilhado possa ser acolhido. Vazio esse que só pode ser preenchido por meio de um sincero e abnegado desejo de conhecer e compreender o que está sendo partilhado e de saber quem seria o autor desse gesto. Para realizarmos essa empreitada, não tem "lesco-lesco": será exigida de nós uma boa dose de paciência, dedicação, desprendimento e amor pela verdade. Bem, é aí que a porca torce o rabo, porque no mundo contemporâneo somos condicionados...

FRAGMENTOS DE UM DIÁRIO HETERODOXO #021

Uma sociedade onde criticar as instituições democráticas é uma impossibilidade pode ser qualquer coisa, menos uma sociedade democrática. # É com a crítica e a autocrítica que uma democracia se aperfeiçoa e se fortalece. Sem isso, ela fenece e se torna uma tirania que, ironicamente, continuará a se apresentar como democracia. # As pelejas políticas nunca são decididas em um único ato. Elas são lentamente desenhadas pela mão não tão invisível do "destino", que é guiada pelo braço do longo prazo. É apenas com o passar do tempo que os atos políticos do presente revelam sua forma e significado. # A construção do conhecimento não pode ser encarada como uma linha de montagem. # Estar publicamente ocupado não é o mesmo que ser produtivo. # Não existem equipes que são essencialmente ruins; o que existe são equipes mal conduzidas por aquilo que poderíamos chamar de líderes "reborn". # As lições que a vida nos apresenta só são difíceis de ser assimiladas por aqueles que fazem ...

PARA QUE AS PANELAS SEJAM FURADAS

Eugen Rosenstock-Huessy, em sua obra “A origem da linguagem”, nos ensina que quando os amigos não mais conseguem se entender, temos uma crise. Agora, quando os inimigos não mais são capazes disso, temos uma guerra. E isso acontece quando as palavras perdem o seu valor, devido ao uso inapropriado que as inflaciona com toda ordem de significados subjetivos, inviabilizando qualquer discussão minimamente razoável. Por essa razão, Confúcio, em seus “Analectos”, nos lembra que todo aquele que queira trazer paz e justiça para a sociedade, antes de qualquer coisa, deve procurar retificar as palavras para que as pessoas possam realmente vislumbrar as realidades às quais elas se referem e não apenas as impressões turvas advindas de termos carregados com toda ordem de vícios retóricos e ideológicos. Exemplos de distorções abundam no mundo contemporâneo e, por conta disso, não é à toa, nem por acaso, que o cenário que vislumbramos diante de nossas vidas é o que é: nem um pouco alvissareiro. Se par...

PARA QUE O FRACASSO NÃO SUBA À CABEÇA

É salutar que, quando o assunto é educação, procuremos garantir que todos, como nos lembra Fernando Sabino, iniciem sua jornada do mesmo ponto de partida. No entanto, querer que todos obtenham os mesmos resultados no ponto de chegada, além de ser uma impossibilidade, é uma crueldade. Essa observação, à moda mineira, feita pelo referido escritor, segue o mesmo caminho apontado pela professora Inger Enkvist, que nos lembra que é extremamente temerário um sistema educacional que exige muito pouco — ou que exige praticamente nada — dos estudantes em seus anos de formação. No caso brasileiro, é um pouco pior, porque, além de pouco exigir dos jovens, ainda quer, a todo custo, incutir em suas cabecinhas que eles são protagonistas da construção do seu próprio conhecimento. Não são poucas as autoridades políticas e acadêmicas que dizem aos quatro ventos que as aulas devem ser mais “interessantes”, “diferenciadas”, etc., para atrair os alunos, que devemos investir mais em “metodologias ativas”, ...