Pular para o conteúdo principal

A EDUCAÇÃO NÃO PODE SER RIFADA

O futuro dos filhos de Deus não está à venda, mesmo assim, tem gente que quer porque quer rifá-lo, em regime de urgência.

 

Semana passada, fomos todos pegos de surpresa pelo anúncio do governo do Estado que pretende, na voada, iniciar o processo de terceirização da gestão de duzentos Colégios e, ao anunciar esse controverso projeto, afirmava que o fazia com seu burocrático coração cheio, até a tampa, de boas intenções, dando-nos a entender que o futuro dos filhos de Deus lhes pertence.

 

Não, não lhes pertence e, quanto às suas boníssimas intenções, é importante lembrarmos que aquele lugarzinho, que exala enxofre, está repleto delas.

 

Dito isso, sigamos com o andor. Quando o assunto em pauta é a tal da educação, inúmeros equívocos acabam se sobrepondo e, em razão disso, os reais problemas que afetam a formação das crianças e dos jovens acabam sendo desdenhados, devido a quantidade de questões secundárias que são colocadas em destaque, nas nossas vistas, em regime de urgência, em formações continuadas sem fim ou em clima de histeria.

 

Por isso, afirmamos, de forma enfática, que o problema central do sistema de ensino do nosso país, e em particular no Estado do Paraná, não está na forma como os colégios são geridos. Focar nisso é desviar do problema, por desconhecê-lo, ou por ignorá-lo.

 

Dito de outro modo, discutir a terceirização, a privatização ou a estatização do sistema de ensino, acaba sendo um desvio escabroso da chaga que, de fato, está gangrenando todo esforço sincero para oferecer uma educação realmente aquilatada aos alunos.

 

Se formos realizar uma análise, a partir de uma perspectiva fenomenológica, veremos que no centro da nossa tragédia educacional, está a destruição da autoridade professoral e o estabelecimento de metas que, além de refletirem interesses estranhos a formação integral do indivíduo humano, são indicadores que coletam números que são obtidos por uma metodologia, no mínimo, duvidosa, que não faz transparecer o que realmente as políticas públicas, maquinadas via SEED, estão fazendo com o futuro dos filhos de Deus.

 

O objetivo central da educação não é, nunca foi e jamais será atingir uma série de números pomposos coletados de forma panóptica, mas sim, munir os indivíduos com instrumentos intelectuais que os auxilie a viver e conviver de forma digna, prestativa e boa. E, neste quesito, as políticas educacionais, a muito tempo, não tem isso como elemento pulsante em suas proposições, para infelicidade geral de muitas gerações.

 

Trocando em miúdos, para as diretrizes do Estado o que realmente importa não é a correção e o aprimoramento do educando, porque isso gera números que não ficam bem em seus pomposos indicadores de desempenho. O que lhes interessa é que os números sejam sempre, o tempo todo, positivos, lindos e publicitariamente apresentáveis porque, ao que parece, o futuro dos filhos de Deus, para os donos do poder, seria apenas moeda política.

 

O problema gerado pela corrosão da autoridade professoral, junto com o estabelecimento de metas estranhas ao fazer pedagógico, é tão grave que seus reflexos são sentidos nas Instituições de Ensino Superior que, atualmente, procuram, de forma paliativa, oferecer aos acadêmicos cursos de nivelamento.

 

E isso é apenas a pontinha da ponta do iceberg, que o governo do Estado ignora existir, o sindicato desvia o olhar, as famílias não querem enxergar e que, os doutos, desconversam sem a menor compunção.

 

E cá estamos nós, diante da atitude apressada e destemperada do Governo do Estado que, tal qual Pilatos, quer lavar as suas mãos nas águas lúgubres da terceirização, fingindo crer que esse descalabro seria alguma solução.


Enfim, enquanto alguns querem leiloar o futuro dos filhos de Deus, outros fingem que nada está acontecendo, porque o futuro que está sendo rifado não é o seu, nem dos seus.

 

Escrevinhado por Dartagnan da Silva Zanela - professor, escrevinhador e bebedor de café. Autor de “A QUADRATURA DO CÍRCULO VICIOSO”, entre outros livros.

https://lnk.bio/zanela




Comentários

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

POR UM O PONTO ARQUIMÉDICO

O filósofo polonês Leszek Kolakowski nos ensina que, quando começamos a cogitar a possibilidade de sermos uma grande farsa, é o momento em que realmente estamos iniciando nossa jornada pelas sinuosas veredas da filosofia. Se não somos capazes de olhar de frente as nossas misérias demasiadamente humanas, é sinal de que a nossa alma ainda se encontra mergulhada no fundo de uma caverna lúgubre, feito o Gollum do “Senhor dos Anéis”, que não se cansa de ficar acariciando o seu precioso, ao mesmo tempo que se divorcia da realidade. Podemos dizer que no mundo atual somos uma multidão de Gollums vagando de um lado para o outro, cada qual com o seu precioso, perdendo a lucidez, que é a pior cegueira que há, como nos lembra José Saramago. Falta de lucidez essa que nos torna cegos para o mal que se encontra aninhado em nosso coração e que nos impede de reconhecer a humanidade daqueles que odiamos - e que desumanizamos - sem saber porquê. Hannah Arendt, em “As Origens do Totalitarismo”, nos exp...

FRAGMENTOS DE UM DIÁRIO HETERODOXO #021

Uma sociedade onde criticar as instituições democráticas é uma impossibilidade pode ser qualquer coisa, menos uma sociedade democrática. # É com a crítica e a autocrítica que uma democracia se aperfeiçoa e se fortalece. Sem isso, ela fenece e se torna uma tirania que, ironicamente, continuará a se apresentar como democracia. # As pelejas políticas nunca são decididas em um único ato. Elas são lentamente desenhadas pela mão não tão invisível do "destino", que é guiada pelo braço do longo prazo. É apenas com o passar do tempo que os atos políticos do presente revelam sua forma e significado. # A construção do conhecimento não pode ser encarada como uma linha de montagem. # Estar publicamente ocupado não é o mesmo que ser produtivo. # Não existem equipes que são essencialmente ruins; o que existe são equipes mal conduzidas por aquilo que poderíamos chamar de líderes "reborn". # As lições que a vida nos apresenta só são difíceis de ser assimiladas por aqueles que fazem ...

NO PARAÍSO OCULTO DAS LETRAS APAGADAS

Paul Johnson, no livro “Inimigos da Sociedade”, afirmava que uma das grandes delícias da vida é poder compartilhar suas ideias e opiniões. Bem, estou a léguas de distância do gabarito do referido historiador, mas posso dizer que, de fato, ele tem toda razão. É muito bom partilhar o pouco que sabemos com pessoas que, muitas vezes, nos são desconhecidas, pessoas que, por sua vez, pouco ou nada sabem a nosso respeito. E essa imensidão de desconhecimento que existe entre autores e leitores deve ser preenchida para que aquilo que está sendo compartilhado possa ser acolhido. Vazio esse que só pode ser preenchido por meio de um sincero e abnegado desejo de conhecer e compreender o que está sendo partilhado e de saber quem seria o autor desse gesto. Para realizarmos essa empreitada, não tem "lesco-lesco": será exigida de nós uma boa dose de paciência, dedicação, desprendimento e amor pela verdade. Bem, é aí que a porca torce o rabo, porque no mundo contemporâneo somos condicionados...